O Atendimento Deve Ser Eliminado?

O Atendimento Deve Ser Eliminado?

O Atendimento Deve Ser Eliminado?

O Atendimento Deve Ser Eliminado?

Desde o início desse mês, a Campaign vem publicando reportagens repercutindo as declarações do Chief Brand Officer da P&G Marc Pritchard em palestras proferidas por ele em Londres e nos EUA.

O que rendeu pano pra manga foi o fato de que Pritchard se disse incomodado com a estrutura das agências, no que ele definiu ser um excesso de gerenciamento, restando pouco espaço para a criatividade. Isso acabou virando uma “treta” na qual o Atendimento virou o centro da crítica. De repente, ao ler as matérias, parecia que o recado do executivo teve apenas um direcionamento: “o pessoal do Atendimento não acrescenta nada ao resultado criativo” e deve ser limado da relação.

Muita calma nessa hora

Li as matérias publicadas (aqui e aqui) e assisti a uma das palestras do Pritchard disponível na web.

Creio que o que Pritchard disse foi mais amplo, e respinga em muitas outras coisas. O papel do Atendimento é um pequenino ponto disso tudo.

Pritchard conclamou os anunciantes a tomar as rédeas do seu processo de trabalho com as agências e reinventar o modelo de parceria entre ambos. Desfazer os abismos entre marca (o cliente), criação (a agência) e consumidor. Focar no que realmente interessa – a criatividade – para ganhar agilidade.

Sua proposta é que, nesse novo arranjo, tudo o que não acrescentar ao resultado criativo deva ser evitado, até eliminado. Na sua opinião, existe um excesso de processos e burocracia nas agências. Ele se ressente por estar pagando por uma estrutura que emperra em vez de agilizar. Dá como exemplo as incontáveis reuniões com um monte de profissionais da agência (planejadores, atendimento, gerentes de projeto etc.). E felizmente faz um mea culpa assumindo a responsabilidade pelo número igualmente expressivo de representantes da parte do cliente (sem poder de decisão), o que provocaria esse efeito que ele chama de “buddy system”: se o cliente tem 10 pessoas cuidando do marketing, a agência se sente na obrigação de ter 10 profissionais para atendê-los.

É bom ressaltar que, além da redução de camadas “inúteis”, ele propõe também que mídia e criação trabalhem em conjunto (pra quem não sabe, o modelo de lá não é como o nosso, os birôs de mídia são empresas separadas das agências). Ele considera que tudo isso eliminaria o obstáculo à criatividade e traria a agilidade que a comunicação exige hoje em dia. Além, é claro, dele ter, como cliente, participação mais ativa e lado a lado com a agência.

O que veio depois

Num painel realizado em evento posterior às palestras de Marc Pritchard, provavelmente como reação ao que a mídia repercutiu, o executivo-chefe do McDonald’s Paul Pomroy fez questão de se posicionar de forma mais cautelosa. Defendeu as agências e os gestores de conta, colocando-os como pessoas-chave na tradução do negócio do cliente para os criativos. Pontuou que muitas vezes não são as agências que erram, mas sim os maus clientes que fornecem briefings errados.

Na mesma semana, o diretor executivo do grupo WPP Martin Sorrell declarou em entrevista que já estava implantando times menos burocráticos e mais criativos para trabalhar com a Unilever. Disse ele: “(…) 75% do tempo investido deve ser em torno do produto criativo, em detrimento de ser estratégico, da gestão da conta ou de qualquer outra coisa”.  Viu só? Sorrell não menciona só gestão de conta (atendimento), mas estratégia (planejamento) e “qualquer outra coisa” (portanto, qualquer outro profissional que seja percebido pelo cliente como mais uma camada não relevante para o processo criativo). Revelou que estava, assim, respondendo ao pedido do seu cliente Unilever, que alinhou-se à mesma proposta sugerida pela P&G, e buscou redefinir a relação com a agência.

O que podemos aprender com isso

Embora a P&G seja o maior anunciante do mundo e possa influenciar decisões em cadeia, são as demandas dos diferentes clientes que acabam por determinar de que forma qualquer agência vai trabalhar.

Há contas que demandam um arranjo onde a agilidade deve estar no foco e muitos processos – e custos, claro – podem ser eliminados. Já outras… Quem já trabalhou com contas públicas (prefeituras, governos) sabe bem o nível de burocracia envolvido para cumprir com todos os protocolos e sabe quanto tempo é necessário para que cada decisão seja tomada no cliente. Nesses casos, há muito tempo dispensado na parte gerencial e comparativamente menos na estratégia criativa. Empresas anunciantes muito hierarquizadas também levam as agências a implantar estruturas com muito foco nos processos gerenciais.

Outro ponto: ninguém aqui discute que criação é o core business das agências. Mas também sabemos que a criatividade não se restringe ao departamento de criação. Ainda mais nos dias de hoje, onde as barreiras entre as disciplinas vem caindo consideravelmente. Portanto, se você tem algo a acrescentar ao resultado criativo, seja você Atendimento ou não, certamente o cliente não vai se importar com o nome do seu cargo.

Afinal, esse papo nem é novo

Tudo o que foi proposto por Marc Pritchard agora é reflexo de outras questões bem mais complexas que vêm acontecendo na nossa indústria desde o advento do digital, e que ainda vão dar muito pano pra manga. Mais uma vez, repito: as tais “camadas de intermediação” que retiram a criatividade do protagonismo vão muito além do trabalho de um gestor de contas (se quiser saber mais, leia este artigo de Pyr Marcondes no Meio & Mensagem, escrito há mais de um ano).

Mais uma coisa: metodologias ágeis também têm estado em pauta há alguns anos. Eu mesma escrevi um artigo contando sobre um desses métodos usados na RG/A com um de seus clientes e que, já em 2004, propunha, até mesmo, a eliminação do brief.

Voltando ao fio da meada, o que se pode extrair da proposta da P&G é que o momento é de reinvenção. Nas palavras de Pritchard: “reinvenção da mídia, reinvenção da propaganda e reinvenção da parceria cliente-agência”.

No caso da parceria, ele propõe que agência e cliente repensem seu modelo para trabalhar colaborativamente. Anunciantes devem trabalhar com as agências e não através das agências, diz ele.

À propósito, no final da palestra que assisti ele deixa uma provocação para todos nós:

Se você trabalha numa agência, o que poderia parar de fazer que não agrega valor ao resultado criativo? E o que poderia começar a fazer para criar valores verdadeiramente únicos para seus clientes?

Acho que é o que a gente deveria pensar desde sempre, concorda?

Bom levar uma sacudida de vez em quando para que a gente não se perca.

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