Liderança e Psicanálise – Entrevista Com Haendel Motta

Liderança e Psicanálise – Entrevista Com Haendel Motta

Liderança e Psicanálise – Entrevista Com Haendel Motta

Liderança e Psicanálise – Entrevista Com Haendel Motta

Haendel Motta é mestre em psicologia clínica. Em certo momento da vida seu interesse se voltou para o mundo corporativo. Seu olhar psicanalítico sobre liderança chamou minha atenção e há algum tempo venho acompanhando o conteúdo que produz no LinkedIn.

Esse mês, ele lançou o e-book “4 Conceitos da Psicanálise Para o Mundo Corporativo”. onde discorre sobre os temas liderança, motivação e modelo mental. Um prato cheio para quem quer se aprofundar nesses assuntos.

Nesta entrevista exclusiva para o blog, Haendel nos fala um pouco mais sobre os conceitos abordados no livro. Espero que você goste e aproveite esse conteúdo.

Katia Viola – Haendel, começando pelo começo. Por que você, enquanto psicanalista, começou a se interessar pelas questões ligadas à liderança no meio corporativo? 

Haeldel Motta – Primeiro, muito obrigado pelo convite para a entrevista. Sim, sou psicólogo de formação, com especialização e mestrado em psicanálise, então uma carreira voltada para Freud e Lacan seria o destino provável. Mas, em 2007, passo no concurso para psicólogo da Marinha, e isso com certeza muda as peças de lugar. Durante o curso de formação há um módulo de Liderança, com conteúdos que até então eu não tinha notícia, e meu interesse pelo tema vai nas alturas.

Ao mesmo tempo em que vou ganhando experiência clínica no sistema de saúde da Marinha, passo a chefiar equipes. Com isso, procuro cada vez mais leituras de DruckerJim Collins, entre outros, ah, e de uma autora brasileira excelente, Cecília Bergamini. Bom, daí começo a perceber que liderança e gestão de pessoas habitam na interseção entre os cursos de Administração e Psicologia.

Por outro lado, reparo que muitas vezes temas complexos da psicologia chegam de modo simplificado na biblioteca corporativa. Então, praticamente me dou essa missão de contribuir para os estudos de liderança através do olhar da psicanálise. Realizo pesquisas e encontro poucos autores que já se propuseram a isso, basicamente dois: Kets de Vries e Laurent Lapierre. Passo a produzir e publicar meus próprios artigos.

Depois de um tempo – e muito por conta do incentivo que recebo cada vez que dou uma palestra sobre isso – resolvo publicar o e-book, que disponibilizo hoje gratuitamente. 

 KV – Podemos concluir (aproveitando a provocação do André Sousa no prefácio do seu e-book) que dá para combinar Lacan com Drucker…

HM – Olha, o momento em que vivemos é justamente esse, o de ‘conectar pontos’, então te digo que a conexão não está lá dada, mas o trabalho de construir essas pontes é possível sim e totalmente instigante pra mim.

KV – A propósito, “liderança” tem sido uma palavra muito ouvida nesses tempos de pandemia. Não há um dia em que líderes de países ao redor do mundo não sejam comparados entre si e avaliados nesse quesito. Exige-se também das lideranças empresariais atitudes, decisões, e principalmente acertos. Na sua opinião, liderança se aprende ou um líder já nasce pronto?

HM – Acho que o desafio é justamente entender que as ferramentas de liderança que você pode aprender nos livros não podem ficar descoladas da pessoa que você é, com toda sua história e repertório de valores. Do contrário, podemos acabar soando artificiais, demonstrando contradições entre o que falamos e fazemos no dia a dia, o que compromete a credibilidade.

Outra questão é que livros e treinamentos de liderança podem ir de abordagens ricas e bem fundamentadas até outras apenas românticas, simplórias ou, pior, que não fazem diferença na prática.

O ponto em que sempre insisto é que a psicanálise pode contribuir para liderança não no sentido de oferecer novas ferramentas (já estamos na verdade saturados com tantas ferramentas), a questão principal é encurtar a distância entre a prática e o discurso, encorajando a pessoa a trazer para a tona seu próprio posicionamento e estilo sobre o que seja liderar – isso libera a pessoa para criar caminhos, ao invés de apenas investir em cumprir intermináveis listas de 10 hábitos, 5 passos, dentre outros modismos e buzzwords corporativos.

KV- Já que estamos falando do mundo corporativo, eu não poderia deixar de abordar o conceito de Inteligência Emocional. Desde que Daniel Goleman lançou um livro sobre o assunto, na década de 1990, o tema virou objeto de outros livros, palestras, treinamentos etc. No seu e-book você menciona que a IE explora pouco a questão do exame e aprimoramento de nossa visão de mundo. Poderia discorrer melhor sobre isso?

HM – Um ponto que me parece ignorado nos estudos da IE é o que Freud chamou de “repetições de destino”, que tem a ver com aquela impressão de trocar de chefe ou emprego e, lá na frente, sentir que você está repetindo com outras pessoas os mesmos antigos impasses e situações desgastantes.

A IE foca em identificar nossas emoções através do self awareness, de modo a entender e lidar melhor com elas, ok, mas isso pode ser enganoso por dois motivos: o primeiro é que nossa percepção sobre nós mesmos é limitada, e a Janela de Johari é perfeita para apontar isso ao falar em ‘pontos cegos’ do indivíduo.

A outra questão é que muitos procuram na IE uma certa técnica adaptativa para lidar com as emoções, mas sem atentar para a questão da visão de mundo, ou mindset, que orienta a estrutura repertorial do sujeito e, consequentemente, seus padrões repetitivos de conduta. Sem atentar para isso, podemos ficar apenas patinando na superfície sem considerar a responsabilidade sobre o que nos faz repetir.

Outro dia recebi essa piadinha no whatsapp: “se você não faz terapia, seu ex-marido volta no corpo de outra pessoa”, rs. Até hoje não vi – mas pode ser falta de pesquisa minha – a IE abordar esse assunto.

KV – Para mim, um dos conceitos mais interessantes abordados no seu livro é o da “via de pôr” (conhecimento) e “via de retirar” (eliminação de mindsets fixos). Para aprofundarmos melhor esse assunto: até que ponto adquirir conhecimento é importante para quem deseja se tornar um bom líder? E por que a coragem de jogar fora o que nos amarra pode contribuir para o nosso crescimento como pessoa e como profissional em posição de liderança
?

HM  Esse ponto é chave, e acho mesmo que é uma das principais contribuições que a psicanálise pode trazer para líderes. Em parte, já respondi essa pergunta quando disse que não se trata apenas de copiar-colar ferramentas de liderança, mas extrair de si um entendimento próprio, um estilo e um manejo autoral sobre elas.

É Freud que, citando Leonardo da Vinci, traz essa comparação entre a pintura, que é uma ‘via de pôr’ tinta sobre a tela branca, em relação à escultura, que seria uma ‘via de retirar’ lascas da pedra bruta.

Acho que essa coragem para retirar – um estilo próprio, uma conduta autoral, uma manobra ousada que você acredita – é bem diferente de simplesmente ampliar sua bagagem de conhecimento e depois não conseguir desdobrá-la em efeitos práticos e, principalmente, resultados.

Aliás, defino liderança como trazer resultados além do que o poder de mando do cargo é capaz de produzir. Sem resultados, tudo pode não passar de romantismo lideracional, e a via de pôr pode produzir isso: alguém que anotou tudo no curso de liderança que fez, mas não se empenhou em casar o que recebeu com aquilo que de fato acredita – caso se empenhe, certamente irá jogar muita coisa fora.

Também podemos situar a diferença entre ‘treinamento’ e ‘desenvolvimento’ de líderes: o primeiro sugere aderência a um modelo a seguir, via de pôr; o segundo fala de alavancar potenciais inerentes, via de retirar.

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Bom, depois dessa verdadeira aula e de todas as incríveis referências citadas pelo Haendel Motta (todas com o hiperlink para facilitar a consulta), só nos resta aproveitar o conteúdo para nos aprimorarmos profissionalmente e pessoalmente. Começando pelo e-book  4 Conceitos da Psicanálise Para o Mundo Corporativo , que está disponível gratuitamente.

Vamos começar já?

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